quinta-feira, 29 de outubro de 2009

E todo o meu suor foi pelo ralo, enfim

Melancolia e céu negro.
E o drama enforcado dentro do meu guarda-roupas. Esperando eu abrir a porta pra me mostrar a cara branca e sem sangue de morte.

Hoje eu sucumbi.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Aqui fora não há estrelas

-E toda essa chuva, eu enfio aonde, no rabo?
Ela perguntou enquanto tentava tapar as feridas abertas da cara dela no espelho.
-Ou eu tomo uma overdose de morfina e finjo que tô dormindo no céu? Hein?
A-ha-ha. No colinho de deus. Céu... Essa historinha de céu nunca me convenceu não, menina. Vê se não escuta tudo que te contam. A vida parece um pouco com um hotel de rodoviária: sujo e sem cortinas. Não é qualquer um que aguenta muito tempo não.
E cadê o tal do céu aqui agora pra consertar minha pele doente? Hãn?
Eu sô só mais uma filha sem mãe nem céu porra nenhuma. Outra filha da dor desses corredores da noite, feitos de mijo e sangue. O teu mijo e o meu sangue.
Mas medo eu não tenho faz tempo.
O trem da morte apita apita apita e pára, e daí, você pondera, não vê nada melhor e embarca. Acende um cigarro amassado, estica as pernas e espera.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

"O céu brilhante e vazio sobre os lados rasgados da cidade"

O som da britadeira e da música gloriosa de enterro tão doce e mórbida na tv de alguém.
O cheiro de fritura e esgoto.
O vento violento na janela - feito um papai bêbado que chega em casa com sede de estilhaçar (um genital).
E meu coração semi-vivo cravado no pedestal do céu, de lanchinho pr'algum deus esfomiado. Canibal.

Deus estuprador de sonhos.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

...

Apesar de todo o brilho de tudo e das noites que passam, segunda-feira sempre tem esse gosto de café velho. Gelado.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Sobre mastigar mastigar e cuspir de volta, igualzinho

Cansei das minhas palavras gastas.
De mim tão redundante.
Dessa cópia barata de mim mesma reproduzida um milhão de vezes igual igual e de novo...
Não sei. É só que parece que não consigo mais escrever as coisas.
Talvez seja só o frio.
Espero que não seja apatia à vida. Tudo, menos apatia.
Morro de medo de perder a capacidade de contemplação.

Parece que algo já se perdeu. Talvez tenha sido a sorte.
Mala suerte.

Queria deitar de novo no colo d'agua de Iemanjá, chupar-lhe os peitos com devoção, e então dormir em paz.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Sobre a manhã amassada e só

Demora pra amanhecer na cidade onde a noite vem logo.
E a manhã chega assim, tão densa que é quase sólida. Quase esbarro nos pedaços de dia que começam a surgir sobre os carros barulhentos e me perturba. A manhã parece um pouco com uma perua efusiva que vive numa casa bonita segura e que não enxerga um palmo na frente das fuças. Tenho vontade de arrebentar a cara da perua até que ela morra afogada com o próprio sangue grosso preto pra sentir um pouquinho de vida que ferve. Ainda que a culpa seja minha. Ainda que.
Tenho medo porque sou um pouco hipócrita e na verdade estou mais perto da perua do que do mendigo louco que eu idolatro e afasto. Idolatro e afasto, idolatro e afasto... acabo fugindo com as calças mijadas de pavor fedido. Bela sina esta de pisar nos meus próprios pés. Bela sina esta de achar bonito - do outro lado do muro. Apesar destas bolsas pesadas que carrego e enrolam nos meus joelhos hoje e do suor que me escorre. Apesar dos olhos ardendo, do ombro que dói e da boca seca de noite chacoalhada. Apesar da fome agora. Apesar do relógio.
Apesar de.
Na verdade verdade verdade estou mais perto é de mim mesma. Quase sentada no meu próprio colo vazio de tanto meio-termo. Nem quente nem frio, pequeno e só. Que possa ser o teu bom lar, ao menos. Já que não o meu.
Uma puta esbaforida atravessa na minha frente. Tão linda assim trôpega e ofegante, cheia de brilho apagado e tão cansada quanto eu nesta quase-manhã frenética que não me dá licença nem pra existir. Nem pra dormir um pouquinho. Agora que eu finalmente ia dormir.
Agora que.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

My bloody gargantine

Hoje senti saudades dos pontos na boca e do gosto do sangue quente sendo engolido com saliva. Como saliva.
Parecia com um lar.
Um lar estreito. Eu caminho caminho neste corredor apertado e por mais que eu afunde um pouco na bosta é sempre macio.
Entorpecida pela luz amarela aqui. Casa.
O assoalho que range sob nosso peso de domingo. O cheiro do alho e do creme azul da avon nas mãos cheias de veias da minha mãe. O seio macio. O suor sobre os labios finos lindos dela. O suor no cabelo dela. Eu queria poder secar e curar tudo nela com minha língua áspera.

terça-feira, 10 de março de 2009

Sob nosso manto de escombros

Com fogo nos joelhos finos e a garganta seca:
- Eu tenho gosto de que?
Mais uma lambida e um uivo de vida. Respiração molhada. Outra lambida.
Duas. Três. Quatro lambidas. Coração em pêlos. Uns segundos mudos. E a resposta:
- Tem gosto de carne que rasga. De tempo que derrete. De vingança que não acaba nunca.

domingo, 8 de março de 2009

Outra súplica rápida

De quem tens medo?
Da noite acordada ou do espancador de vidas?
Deus soberbo pai de toda frustração e todo o medo, livrai-me de mim. Amém.

Sobre a noite e a noite e a noite (e as pessoas-janela)

Eu queria ser tão grande quando a minha sombra que existe ali na parede vazia.
Noite muda. Mais uma vez.
A vida em quadrados. Assisto aqui, do alto, recortes de tanto numa cápsula 1x1. E com cortinas.
A moça do sofá coça a perna. Pisca pra tv que não pisca de volta. Acho que ela não vai acordar cedo amanhã, assim como eu. Podíamos sentar lá embaixo nós duas e deixar a noite morrer. Ela podia me dar uma meia dúzia de frases prontas, que seja. Eu lhe daria mais meia dúzia e deu. Quem sabe até não veríamos dentro do buraco quente dos olhos uma da outra? Sei lá. Ela nem me deixou propor. Foi o tempo de eu correr buscar esta caneta e ela sumir do sofá dela sobre o mundo.
Ta lá o sofá. Imbecil.
Me olhando baldio.
Aquela toalha meio rasgada. A sala limpinha quente aconchegante - hostil pra mim. Sussurrou na minha cara um "boa noite venha morrer confortável aqui na luz amarela" e eu estremeci. Vomitei.
Eu preciso da rua agora e sei que não vou ter.
Ainda morrerei de calor ou insônia ou câncer na canela esquerda.
A rua está longe-logo ali embaixo. Só uns dois ou três lances de escada.
Mas e achar uma camiseta? E encontrar as chaves? E o maço? E ficar lá conversando com o banco de novo?
Sei que vou ficar aqui assim. Meio patética. Com esse sono azedo meio não sono.
Escrevendo sob a luz de uma lanterna fajuta e a sombra de alguém que dorme sem mim.
Gostaria que dormisse em mim hoje.

Sobre o asfalto quente

Eu e a estrada de novo. Amiga de não tão longa data e já tão tão íntima. Ela mora na minha pele e eu na dela. Na pele quente e áspera dela. Hoje molhada. Nós duas.
Eu de gozo e saudade e medo e vida.
A vida é úmida, não é?

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Sobre os milhões de dias de um mês do ano

Eu sou uma escultura torta escorrendo no bueiro de uma rodoviária. Nascendo no asfalto quente.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Uma carta suplicante

Por favor,
recolha estes meus retalhos doloridos e me ajude a enfiar no cu de deus e fazer um mosaico colorido lá dentro.