terça-feira, 10 de março de 2009

Sob nosso manto de escombros

Com fogo nos joelhos finos e a garganta seca:
- Eu tenho gosto de que?
Mais uma lambida e um uivo de vida. Respiração molhada. Outra lambida.
Duas. Três. Quatro lambidas. Coração em pêlos. Uns segundos mudos. E a resposta:
- Tem gosto de carne que rasga. De tempo que derrete. De vingança que não acaba nunca.

domingo, 8 de março de 2009

Outra súplica rápida

De quem tens medo?
Da noite acordada ou do espancador de vidas?
Deus soberbo pai de toda frustração e todo o medo, livrai-me de mim. Amém.

Sobre a noite e a noite e a noite (e as pessoas-janela)

Eu queria ser tão grande quando a minha sombra que existe ali na parede vazia.
Noite muda. Mais uma vez.
A vida em quadrados. Assisto aqui, do alto, recortes de tanto numa cápsula 1x1. E com cortinas.
A moça do sofá coça a perna. Pisca pra tv que não pisca de volta. Acho que ela não vai acordar cedo amanhã, assim como eu. Podíamos sentar lá embaixo nós duas e deixar a noite morrer. Ela podia me dar uma meia dúzia de frases prontas, que seja. Eu lhe daria mais meia dúzia e deu. Quem sabe até não veríamos dentro do buraco quente dos olhos uma da outra? Sei lá. Ela nem me deixou propor. Foi o tempo de eu correr buscar esta caneta e ela sumir do sofá dela sobre o mundo.
Ta lá o sofá. Imbecil.
Me olhando baldio.
Aquela toalha meio rasgada. A sala limpinha quente aconchegante - hostil pra mim. Sussurrou na minha cara um "boa noite venha morrer confortável aqui na luz amarela" e eu estremeci. Vomitei.
Eu preciso da rua agora e sei que não vou ter.
Ainda morrerei de calor ou insônia ou câncer na canela esquerda.
A rua está longe-logo ali embaixo. Só uns dois ou três lances de escada.
Mas e achar uma camiseta? E encontrar as chaves? E o maço? E ficar lá conversando com o banco de novo?
Sei que vou ficar aqui assim. Meio patética. Com esse sono azedo meio não sono.
Escrevendo sob a luz de uma lanterna fajuta e a sombra de alguém que dorme sem mim.
Gostaria que dormisse em mim hoje.

Sobre o asfalto quente

Eu e a estrada de novo. Amiga de não tão longa data e já tão tão íntima. Ela mora na minha pele e eu na dela. Na pele quente e áspera dela. Hoje molhada. Nós duas.
Eu de gozo e saudade e medo e vida.
A vida é úmida, não é?