quarta-feira, 29 de abril de 2009

Sobre a manhã amassada e só

Demora pra amanhecer na cidade onde a noite vem logo.
E a manhã chega assim, tão densa que é quase sólida. Quase esbarro nos pedaços de dia que começam a surgir sobre os carros barulhentos e me perturba. A manhã parece um pouco com uma perua efusiva que vive numa casa bonita segura e que não enxerga um palmo na frente das fuças. Tenho vontade de arrebentar a cara da perua até que ela morra afogada com o próprio sangue grosso preto pra sentir um pouquinho de vida que ferve. Ainda que a culpa seja minha. Ainda que.
Tenho medo porque sou um pouco hipócrita e na verdade estou mais perto da perua do que do mendigo louco que eu idolatro e afasto. Idolatro e afasto, idolatro e afasto... acabo fugindo com as calças mijadas de pavor fedido. Bela sina esta de pisar nos meus próprios pés. Bela sina esta de achar bonito - do outro lado do muro. Apesar destas bolsas pesadas que carrego e enrolam nos meus joelhos hoje e do suor que me escorre. Apesar dos olhos ardendo, do ombro que dói e da boca seca de noite chacoalhada. Apesar da fome agora. Apesar do relógio.
Apesar de.
Na verdade verdade verdade estou mais perto é de mim mesma. Quase sentada no meu próprio colo vazio de tanto meio-termo. Nem quente nem frio, pequeno e só. Que possa ser o teu bom lar, ao menos. Já que não o meu.
Uma puta esbaforida atravessa na minha frente. Tão linda assim trôpega e ofegante, cheia de brilho apagado e tão cansada quanto eu nesta quase-manhã frenética que não me dá licença nem pra existir. Nem pra dormir um pouquinho. Agora que eu finalmente ia dormir.
Agora que.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

My bloody gargantine

Hoje senti saudades dos pontos na boca e do gosto do sangue quente sendo engolido com saliva. Como saliva.
Parecia com um lar.
Um lar estreito. Eu caminho caminho neste corredor apertado e por mais que eu afunde um pouco na bosta é sempre macio.
Entorpecida pela luz amarela aqui. Casa.
O assoalho que range sob nosso peso de domingo. O cheiro do alho e do creme azul da avon nas mãos cheias de veias da minha mãe. O seio macio. O suor sobre os labios finos lindos dela. O suor no cabelo dela. Eu queria poder secar e curar tudo nela com minha língua áspera.